Gastronomia em transe : itinerários de crise estética da comida contemporânea

Abstract

Por um olhar fenomenológico, evoco o lugar e a condição da gastronomia e das crises estéticas que operam como catalizadores dos deslocamentos da percepção da comida contemporânea, a partir da modernidade oitocentista até as questões atuais. Para investigar esse fenômeno, apresento nesta tese itinerários da comida por percursos temáticos da experiência com a comida contemporânea, objeto de pesquisa. Os itinerários passam por discussões acerca da epistemologia, da estética, da imagem, da mídia, do transe e da transcendência. A pesquisa parte de uma questão comunicacional para adentrar no campo transversal, porém, ainda muito jovem, dentro das chamadas ciências gastronômicas, pela perspectiva da experiência estética. Quanto tempero narrativo, processamento midiático e reconstituições históricas somam-se ao caráter imaginativo e sensível que retroalimenta a comida contemporânea? Não há uma resposta objetiva e, como o próprio ato de cozinhar, depende de intuição, tentativas e erros. No entanto, a pesquisa toca em temas eminentemente contemporâneos acerca do universo conceitual e relacional que envolve a comida. Assim, desvendo o processo de gastronomização, do qual faz nascer conceitos inéditos, como o do sujeito gastronomizado e percepções fenomenológicas que permitem conhecer em profundidade a complexidade deste sujeito. Dentre elas, estão novos problemas perceptivos e estéticos como o uso da gastronomia como gênero narrativo e um processo de comer com os olhos que, definitivamente, provoca uma questão maior do que a expressão popular, ao qual descrevi como “binge tasting” e “bulimia da percepção”. Essas descobertas foram realizadas a partir da fenomenologia da percepção de Merleau-Ponty, para discutir de forma transdisciplinar (de questões antropológicas, sociológicas, comunicacionais e filosóficas) a questão estética da comida, em diálogo com o teórico contemporâneo Nicola Perullo. Esta busca, por fim, resulta em reconhecer o fenômeno maior que habita uma gastronomia em estado de transe, que é desvendada aos poucos adentrando a esfera da transcendência e de uma nova proposta de “restauração”, a Recozinha.