A oferta de itinerários formativos no novo Ensino Médio em redes de ensino públicas do Acre, Ceará e do Distrito Federal : reflexões curriculares

Abstract

A implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) em 2017 e a subsequente Reforma do Ensino Médio (2018) têm provocado intensos debates na sociedade brasileira e na comunidade acadêmica. Esta pesquisa foi desenvolvida no Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Trabalho Docente, Didática e Organização do Trabalho Pedagógico – Prodocência, no âmbito do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB), na Linha de Pesquisa Profissão Docente, Currículo e Avaliação (PDCA), entre 2021 e 2024. O estudo orientou-se pela questão central: como os IF foram contemplados nas propostas curriculares do Ensino Médio das redes públicas de Acre, Ceará e Distrito Federal. O objetivo geral foi analisar como os IF no Novo Ensino Médio (NEM) foram contemplados nesses estados/DF, a partir do qual se desdobraram os seguintes objetivos específicos: a) investigar as prescrições curriculares das secretarias de educação do Acre, Ceará e Distrito Federal para os IF no NEM; b) compreender como as secretarias e regionais de ensino orientam, acompanham e avaliam a oferta dos IF pelas escolas públicas; c) identificar os critérios utilizados pelas redes de ensino na escolha dos IF e suas repercussões na reestruturação curricular; d) discutir os significados atribuídos pelos gestores educacionais aos IF e suas implicações na organização do trabalho escolar; e) compreender como os itinerários são ofertados considerando as especificidades regionais, culturais, sociais, econômicas e educacionais. Sustenta-se como tese que a implementação da Base e a estruturação de IF foram permeadas por desafios complexos e contraditórios, tendo em vista as tensões quanto aos seus fundamentos, objetivos, exequibilidade e viabilidade; revelando um distanciamento entre a teoria e a prática educativa nos contextos estudados. Metodologicamente, a pesquisa qualitativa utilizou estudo de caso múltiplo (Yin, 2015), fundamentado no Materialismo Histórico-Dialético (Netto, 2011). Os dados foram levantados por meio de análise documental, questionários e entrevistas com gestores educacionais das capitais Rio Branco, Fortaleza e Distrito Federal. A leitura e organização dos dados utilizou o procedimento de Núcleos de Significação (Aguiar; Ozella, 2006), gerando quatro categorias de análise: perspectivas filosóficas e epistemológicas; determinações externas no trabalho docente; reorganização curricular; e desafios das redes de ensino. Os resultados revelaram: a) que os IF, apresentados como inovação curricular, sofrem forte influência de determinações externas, comprometendo a autonomia docente e a qualidade do ensino; b) apesar da proposta de flexibilização, sua implementação enfrenta significativos entraves estruturais e logísticos; c) o modelo NEM apresenta implicações como o aligeiramento da formação juvenil e o reforço de disparidades sociais por meio do ensino dual; d) há intencionalidade política nas desigualdades do Ensino Médio brasileiro, manifestada pela adoção do ensino por competências de orientação mercadológica e pela expropriação do trabalho docente; e) o projeto deliberado de manutenção do status quo promove uma formação fragmentada, especialmente para classes menos favorecidas, sob o pretexto da necessidade de formação técnica precoce; f) as mudanças na legislação ao final de 2024, incluindo a redução da carga horária mínima para os IF, não alteraram substancialmente os problemas estruturais do modelo. Defende-se, portanto, a revogação integral do NEM e a construção de um projeto educacional verdadeiramente inclusivo e integral, que atenda às demandas sociais e regionais do país, superando a perspectiva de reformas curriculares isoladas como solução para a qualidade da formação das juventudes brasileiras.