O estágio em Psicologia Escolar Crítica e as vivências (trans)formadoras de estudantes-trabalhadoras rondonienses

Abstract

A formação em Psicologia Escolar (PE) vem sendo discutida veemente, desde a década de 1980, quando questões ideológicas, políticas e sociais concernentes ao conhecimento produzido por essa área e suas práticas de atuação passaram a ser desveladas criticamente demandando a sua (re)construção sob a base do compromisso social dessa profissão para com o enfrentamento e superação das desigualdades e injustiças sociais. Recentemente, com a aprovação da Lei 13.935/2019, a qual dispõe sobre a prestação de serviços de Psicologia e de Serviço Social nas redes públicas de Educação Básica, a pauta sobre a formação nessa área se tornou, ainda, mais necessária. Diante dessa realidade, esse estudo objetivou investigar a formação da perspectiva crítica em PE a partir de uma experiência concreta de estágio básico desenvolvida em uma instituição de ensino superior privada no interior de Rondônia. Para isso, empreendeu-se uma pesquisa empírica de caráter exploratório-explicativa ancorada no Método Histórico-Cultural, cujas informações foram apreendidas através de: documentos nacionais e institucionais sobre as Políticas Educacionais formativas, questionário sobre o perfil históricosocial e formativo aplicado com 32 estudantes do estágio básico em Processos Educacionais, e entrevista em profundidade com 6 estudantes. A análise das informações ocorreu a partir da dialética singular-particular-universal e foi estruturada na forma de dois estudos. O estudo 1 tratou da análise dos condicionantes histórico-sociais e formativos presentes no território, currículo e trajetórias de vida estudantil. Este estudo revelou que a formação em PE tem acontecido sob um processo de expansão, interiorização, mercantilização e oligopolização do Ensino Superior (ES); com a presença de um currículo que guarda contradições históricas através da concomitância de pressupostos clínico-tradicionais e críticos; e da presença de um perfil de popularização e deselitização estudantil, marcado pela prevalência de mulheres, jovens, trabalhadoras e de classes exploradas. O estudo 2 se voltou para a compreensão dos efeitos produzidos pelo estágio básico em PE implementado através das vivências que essa experiência operou na consciência das estudantes-trabalhadoras. Através deste estudo constatou-se que o chão da escola operou diversas vivências, ensejando memórias, experiências dramáticas, momentos de crise e construção de estratégias pedagógicas e trabalhistas para conciliar trabalho e estudo; produzindo (re)configurações na maneira de perceber e se relacionar com a realidade educacional e consigo mesma; evidenciando que o estágio atuou na zona de desenvolvimento proximal, constituindo uma experiência potencialmente (trans)formadora, capaz de colocar em curso o processo de conscientização e criticidade. Em síntese, essa investigação desvelou que a formação de uma perspectiva crítica em PE tem se dado sob algumas contradições, mas que, mesmo assim, o estágio básico constituiu uma experiência crucial para a formação de estudantes mais críticas e engajadas com as questões sociais e políticas. Nesses termos, esperamos que esse estudo colabore para o ensejo de mais pesquisas e práticas educativas que compreendam a estudante de Psicologia enquanto uma pessoa adulta em pleno desenvolvimento, incluindo a categoria investigativa estudante-trabalhadora e o contexto atual de mercantilização do ES nos estudos e na formulação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a graduação em Psicologia, que as Políticas Educacionais sejam pautadas pelas interseccionalidades territoriais, de classe social, gênero, raça, etnia e geracionalidade, que sejam elaborados estágios supervisionados mais situados territorialmente e contextualizados às condições materiais de vida das estudantes, e hajam processos formativos voltados às docentes de Psicologia a fim de desnudar as implicações do capital sobre a vida e a educação, bem como a importância do engajamento afetivo, social e político como forma de enfrentamento às condições alientantes presentes em uma sociedade capitalista.